Para os brasileiros que investem no Tesouro Direto, a primeira semana de setembro tem sido de frustração. Desde terça-feira, dia 1º, o sistema on-line de compra e venda de títulos públicos sofreu suspensão em todos os dias por causa da forte volatilidade nas taxas de juros — um efeito direto da crise política e econômica pela qual passa o país. Assim, durante as horas de suspensão, ninguém consegue adquirir novos títulos nem se desfazer dos papéis que já tem no mercado secundário.
“Devido à forte volatilidade nas taxas de juros dos títulos públicos nesta manhã, informamos que o Tesouro Direto foi suspenso às 09:40. A expectativa é de normalização por volta das 11 horas”, informou o site do Tesouro Direto na manhã desta sexta-feira.
Nos quatro dias deste mês, já foram cinco interrupções, sendo duas apenas na quinta-feira — dia em que rumores sobre uma possível demissão do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, chacoalharam o mercado financeiro. Desde a penúltima semana de março não aconteciam tantas interrupções consecutivas; naquela ocasião, foram seis.
Segundo Virgínia Prestes, mestre em finanças e professora da Faap, as suspensões ocorrem porque os títulos prefixados — pelos quais o aplicador sabe exatamente quanto vai ganhar, caso das Letras do Tesouro Nacional (LTN) — se apreciam no mercado secundário quando a curva de juros cai e se depreciam quando ela sobe. Assim, se os eventos do dia estiverem mexendo demais com a percepção dos investidores sobre o rumo futuro da taxa básica de juros, a Selic, o valor desses títulos pode variar fortemente em questão de minutos. Isso pode acontecer até no caso de alguns títulos pós-fixados, como a popular NTN-B, que paga ao aplicador a inflação mais uma taxa de juros fixada no momento da compra.
— As paralisações causam um transtorno para o investidor, mas esse é um dano menor. Elas são válidas porque o investidor que aplica no Tesouro Direto muitas vezes não tem conhecimento amplo sobre o mercado. Já soube de gente que perdeu 10% no valor do título por causa de turbulência — explicou a professora. — Uma alta volatilidade nunca é bem vinda no mercado de renda fixa. O que está acontecendo é que esse embate entre Joaquim Levy (ministro da Fazenda), Alexandre Tombini (presidente do Banco Central) e Nelson Barbosa (ministro do Planejamento) tem deixado o mercado muito nervoso, elevando a expectativa sobre uma alta de juros.
Mas Flávio Lemos, coordenador da Trader Brasil Escola de Investidores, vê a sequência de suspensões do Tesouro Direto como um grande revés para o investidor.
— Isso atrapalha a vida das pessoas. Quem comprou os títulos sabendo que poderia vendê-los no mercado secundário a qualquer momento acaba constatando que isso não é verdade. Se ele tiver uma conta para a pagar? Isso compromete a transparência do Tesouro Direto. O mercado é dinâmico, e todo tipo de investimento muda mesmo muito rápido. O Tesouro Direto deveria ser, assim como é a Bolsa, verdadeiramente on-line — observou o especialista.
Procurado pelo GLOBO, o Tesouro Nacional ainda não se manifestou.
VOLATILIDADE DOS JUROS FUTUROS DÁ SALTO
Paralisações no Tesouro Direto não são, propriamente, raras, mas o ritmo tem aumentado. Em agosto, por exemplo, foram 11 vezes, embora elas tenham ocorrerido de forma distribuída ao longo do o mês. Em julho foram apenas seis paradas. Em maio, por sua vez, foram cinco.
A instabilidade dos juros futuros, de fato, tem sido grande. No contrato de Depósitos Interfinanceiros (DI) para janeiro de 2021, a volatilidade histórica chegou ao 22,3% na última terça-feira, o maior patamar desde meados de março. Só que, naquela ocasião, a volatilidade estava em trajetória de queda enquanto que, agora, ela é de alta — em 20 de julho, a taxa de volatilidade estava em apenas 11%, por exemplo.
O cálculo leva em conta o “desvio padrão” da taxa de juros, ferramenta estatística que avalia o grau de distanciamento em relação à média — neste caso, a média do contrato DI com vencimento em janeiro de 2021 nos últimos 30 dias.
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